terça-feira, abril 20, 2010

Até o Governo deixou de falar em Jornalismo
- O que está a dar é a produção de conteúdos

O ministro dos Assuntos Parlamentares afirmou hoje que o Governo tenciona avançar com normas que reforcem a “transparência” na "identificação da estrutura de propriedade dos meios de comunicação social e a independência dos directores de conteúdos".

É mesmo para rir. No entanto, numa coisa Jorge Lacão tem razão. É que não fala dos directores dos órgãos de comunicação social. E não fala porque esses orgãos já pouco ou nada existem. Fala, e muito bem – reconheço, nos directores de conteúdos.

E directores de conteúdos são aqueles mercenários que controlam as fábricas de produção de textos de linha branca, e onde trabalham não jornalistas mas – isso sim – os tais produtores de conteúdos.

Jorge Lacão assumiu estas posições no início da audição da Comissão Parlamentar de Ética sobre as relações do Governo com a comunicação social, após uma questão formulada por encomenda pelo deputado socialista João Serrano.

A questão da transparência da titularidade da propriedade dos meios de comunicação social foi levantada com grande insistência por deputados socialistas, durante uma audição desta mesma comissão ao director de informação do semanário “Sol”, António José Saraiva, em Fevereiro.

“Na medida em que está num estado avançado uma revisão das leis da televisão e da rádio, nesse quadro, o Governo poderá encarar algumas soluções jurídicas que possam de alguma maneira ajudar a suprir aspectos de omissão na nossa ordem jurídica, que resultaram da impossibilidade pretérita de aprovação da lei do pluralismo e da não concentração dos meios de comunicação social”, começou por declarar Jorge Lacão.

Mas porque será que o Governo, que o poder político, finge que quer saber quem são os donos dos donos dos tais produtores de conteúdos?

São nada mais nada menos do que formas de tapar o sol com uma peneira. Desde logo porque – como se constata pela tese de Jorge Lacão (já antes bem burilada por Augusto Santos Silva) - para Portugal o jornalismo e a democracia não são preocupações. Estando o país, nesta matéria como em muitas outras, cada vez mais perto do Burkina Faso, não há necessidade de se preocupar com miragens, no caso com o jornalismo e a democracia.

No que ao jornalismo lusitano respeita, basta ver que um qualquer badameco a quem sai o euromilhões, ou a quem a banca o dá, pode ser dono de um ou mais meios de comunicação social, mesmo que a sua experiência e formação empresarial tenha sido feita em prostíbulos.

Prostíbulos, é certo, bem frequentados por muitos políticos da praça lusa, o que é sempre meio caminho andado para se conseguir dar brilho às diversas faces ocultas desta sociedade putrefacta.

De igual modo, basta ver que para “ser” jornalista ou, melhor, produtor de conteúdos como diz o ministro Jorge Lacão, é suficiente abrir as pernas, ou pôr-se de cócoras, ao patrão ou ao director ou, também, ter estagiado em algum dos prostíbulos mais ou menos conhecidos, sobretudo nos de face oculta de tonalidade rosa ou laranja.

Não creio por isso que Portugal esteja minimamente preocupado com estas questões, por muito que o sucessor de Santos Silva pinte a manta. Desde logo porque o jornalismo é apenas uma forma de comércio pelo que, penso, essas peregrinas ideias de “dar voz a quem a não tem”, de “entender que a verdade é a melhor qualidade dos jornalistas” já foi chão que, há muito, muito tempo, deu uvas.

Aliás, os jornalistas que ainda acreditam nessas igénuas regras sentem-se cada vez mais como um tolo no meio da ponte. Não sabem se devem ir em frente ou voltar atrás. E, nos raros momentos de sanidade mental, chegam à conclusão que... nem sequer existe ponte.

Quando as organizações que querem defender os jornalistas e as que dizem que os querem defender se juntam, surge a dúvida sistémica: morrer hoje ou aguentar até amanhã?

Embora a dúvida seja sempre a mesma, a resposta é bem conhecida. A tendência é para a extinção do jornalismo, substituído pela produção em série de conteúdos comerciais de linha branca.

Sobram aqueles idealistas que não deixam de lutar, nem que seja para que o Jornalismo passe a ser reconhecido como uma profissão artesanal.

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