terça-feira, março 13, 2012

Boa! Juiz proíbe Acordo Ortográfico

Um juiz do Tribunal de Viana do Castelo (Portugal) emitiu uma ordem de serviço proibindo a utilização da grafia do novo Acordo Ortográfico, alegando que os tribunais não estão abrangidos pela resolução do governo.

Ora aí está. Aos poucos os portugueses libertam-se dessa atávica tese de que têm de comer e calar. Muitos não se calam e não comem o farelo que aparece.

A decisão do juiz Rui Estrela Oliveira consta de uma ordem de serviço datada de 23 de Janeiro deste ano e aplica-se a todos os processos e tramitações do segundo Juízo Civil daquele tribunal, sendo justificada pelo próprio, em entrevista à Agência Lusa, como uma "questão eminentemente jurídica".

O juiz recorda a resolução do Conselho de Ministros de Dezembro de 2010, que "determina que, a partir de 1 de Janeiro de 2012, o governo e todos os serviços, organismos e entidades sujeitos aos poderes de direcção, superintendência e tutela do Governo aplicam a grafia do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa", para concluir: "Esta antecipação de efeitos não engloba os tribunais, porque não fazem parte do governo. Não são superintendidos, não são dirigidos nem são tutelados pelo Governo". 

Este é, aliás e no caso presente, apenas o primeiro motivo para não aplicar o acordo. 

Paralelamente, a "preocupação" deste juiz, plasmada na ordem de serviço, vai ainda mais longe e chega à própria interpretação jurídica de textos, conforme a aplicação da nova ou da antiga grafia, dando forma ao segundo motivo. 

"Se há campo onde há mais mudanças, na intensidade de utilização de certas palavras, é no Direito. Pode provocar, com o mesmo texto, um sentido totalmente diferente. Isto nunca foi pensado nem acautelado de nenhum modo. Juridicamente é muito importante o que se diz e o modo como se diz", afirma ainda o juiz. 

Aponta como exemplo uma construção da sua autoria, envolvendo "corretores" da bolsa e a função de "corrector", esta pela antiga grafia. 

"De início, o corretor da sala 3 assumia a função de corretor do corretor da sala 2, para depois passar a ser o corretor de todos, até do corretor da última sala que, confrontado com a situação, esboçou um sorriso", apontou o juiz, para logo depois concluir: "Uma vez que corrector perdeu o 'c', o sentido é indecifrável". 

O que o leva ao encontro do terceiro motivo para não aplicar o acordo. "Alguém que está a escrever, se se apercebe disto, não vai escrever. E aí há uma quebra da sua liberdade", garante, assumindo ainda a possibilidade de, com a nova grafia, poder haver "uma situação em que o Tribunal não é entendido na sua ordem", sobretudo por quem apenas aprendeu uma grafia em toda a vida. 

Por outro lado, este juiz entende que a aplicação do novo acordo ainda "não entrou em vigor na ordem jurídica portuguesa", classificando a antecipação da sua aplicação como "um bocadinho forçada, tendo em conta as características do Direito". 

"À partida, o prazo de adaptação deve ser o mais longo possível para os tribunais", afirma o juiz Rui Estrela Oliveira.

Aliás, nem sequer deveria ser adaptado ou utilizado. Isto, é claro, não agrada a todos aqueles – e são tantos, tantos, tantos – que são analfabetos funcionais (sabem ler e escrever mas não lêem nem escrevem).

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