quarta-feira, junho 06, 2012

Coelho elogia paciência dos seus escravos


Como se não bastasse Passos Coelho julgar-se dono da verdade, ainda gosta (terá tido, com certeza, bons professores) de fazer dos plebeus uns asnos.

E está de tal maneira imbuído dessa douta suposição, que vem agora, depois de dizer estar disposto a fazer "alguma modelação" na aplicação das medidas de austeridade com "impacto social mais pesado", elogiar “extrema paciência” do povo português.

Lá que os portugueses aceitem ser, passivamente, escravos ao serviço de um governo que tem um primeiro-ministro que mente, ainda vá que não vá. Mas daí a acreditar que Passos Coelho abandonou a prática do “quero, posso e mando” vai, creio eu, uma grande distância.

“É uma grande admiração que sinto pelos portugueses, quer tenham votado em nós ou não, pela forma como estão a encarar o futuro”, diz o delegado  da Alemanha e de Angola em Portugal, passando uma esponja sobre o facto de o Governo já há muito ter abandonado a tese de que os portugueses iriam morrer da cura ou da doença. Isto é, fez as contas e achou por bem que morram apenas da doença, desde logo porque dessa forma não há necessidade de gastar dinheiro (que, por exemplo, faz falta no BPN) na tentativa de cura.

É claro que Passos Coelho sabe que a sua política atira o país para uma terrível recessão económica, eventualmente irreversível. Mas isso não o preocupa. Quando acabar ele dá à sola e quem vier atrás que feche a porta e pendure a placa da falência.

Quando se vê que alguns políticos sofrem mesmo de nanismo, genético ou adquirido, não sobra margem de manobra para a esperança. Pelos vistos os portugueses sentem-se felizes quando o soba substitui um prato cheio de farelo por dois… meio vazios.

Este cenário faz lembrar a história da família de um militar morto durante a guerra colonial. Quando o Exército foi comunicar aos pais que o filho tinha morrido, disse: Ele foi atingido por sete tiros, mas felizmente só um foi fatal.

O Governo está convencido, e até agora não tem razões práticas para alterar a estratégia, que os escravos contentam-se com migalhas, farelo ou pão e água.

Da mesma opinião são também os ilustres membros da casta superior do reino lusitano, casos de Joaquim Pina Moura, Jorge Coelho, Armando Vara, Manuel Dias Loureiro, Fernando Faria de Oliveira, Fernando Gomes, António Vitorino, Luís Parreirão, José Penedos, Luís Mira Amaral, António Mexia, António Castro Guerra, Joaquim Ferreira do Amaral, Filipe Baptista, Ascenso Simões, Eduardo Catroga.

Ou, igualmente, Cavaco Silva que, em termos vitalícios, só tem direito a 4.152 euros do Banco de Portugal, a 2.328 euros da Universidade Nova de Lisboa e a 2.876 euros de primeiro-ministro.

Mas, reconheça-se, Portugal é um país (se é que é) muito original. Ao mesmo tempo que tem (pelo menos) um milhão e duzentos mil desempregados, 20% de miseráveis e outros 20% de semi-miseráveis, tem uma Presidência da República que apenas representa uma pequena factura de 16 milhões de euros por ano e, sobretudo, um primeiro-ministro que elogia a “extrema paciência” dos seus escravos.

É claro que, no meio da plebe, aparecem sempre as vozes críticas que contestam a necessária e vital opulência de um organismo que dirige o destino de um país que recentemente readoptou o esclavagismo.

Dizem esses seres inferiores, e é por isso que são escravos, que os 16 milhões de euros anuais são um valor 163 vezes superior à presidência de Ramalho Eanes, gastando o chefe de Estado português  o dobro do rei de Espanha (8 milhões).

Esquecem, no entanto, de dizer que a casta superior fica, mesmo assim, longe dos 112 milhões de euros de Nicolas Sarkozy, ou dos 46,6 milhões da rainha de Inglaterra, Isabel II.

Importa também relevar a importância e imprescindibilidade do séquito que acompanha sua majestade D. Cavaco Silva. Ou  seja, 12 assessores e 24 consultores, além dos restantes especialistas que põem em funcionamento a máquina pessoal do presidente e toda a sua estrutura física.

Ao que parece,  Cavaco Silva faz-se rodear de um regimento de quase 500 pessoas, fazendo com que os 300 elementos a trabalhar no Palácio de Buckingham, e os 200 que servem o rei Juan Carlos de Espanha pareçam insignificantes.

Mas ainda bem que assim acontece. Em alguma coisa Portugal haveria de ser grande. Também o é noutras coisas, como seja o bacanal político, as orgias político-económicas e as festas da abundância em que as sobras alimentam os escravos.

Portugal não dá, aliás, a perceber que o seu povo passa fome. Como não tira os sapatos ninguém percebe que tem a meias rotas. Veja-se, por exemplo, que na 21ª Cimeira Ibero-Americana, realizada no Paraguai, o reino lusitano mostrou toda a sua pujança.

Mostrando mais uma vez a sua coerência e depois de ter dito que “ninguém está imune aos sacrifícios”,  Aníbal Cavaco Silva levou ao Paraguai uma comitiva de 23 super-especialistas, com destaque para o seu médico pessoal e, é claro, para o seu mordomo.

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