quarta-feira, junho 06, 2012

A saúde é um direito fundamental? Onde?


O Presidente da República disse hoje que seria "inaceitável" que os portugueses que não têm recursos económicos não pudessem ser tratados nos hospitais, frisando que "a saúde é um direito fundamental".

"A saúde é um direito fundamental dos cidadãos numa sociedade democrática e seria inaceitável que se verificasse aquilo que se verifica nalguns países do mundo em que se não tem um seguro ou se não tem recursos financeiros então fica à porta do hospital e não é tratado", afirmou o chefe de Estado.

Pois é. O rapazola até fala bem, mas sacode ainda melhor a água do capote. Seja porque a Constituição não o permite, seja porque é um assunto do governo, seja porque é uma imposição da troika, Cavaco Silva  continua a solidificar a sua postura de figura decorativa da sociedade portuguesa.

O presidente sabe que são cada vez mais os especialistas em saúde pública que associam o excesso de mortalidade à crise económica, se bem que a crise seja uma questão (muito) relativa.

É certo, contudo, que quatro em cada dez portugueses admitem fazer cortes no orçamento familiar para poderem comprar medicamentos. Nada mais salutar. Ou comem ou tomam medicamentos. As duas coisas juntas é que não pode ser, diriam com certeza Passos Coelho e Cavaco Silva.

O barómetro "Os portugueses e a saúde" nunca foi, nem será, lido pelos ministros deste governo, muito menos por Cavaco Silva. Está lá escrito que 1,2 milhões de portugueses afirmam que deixam na farmácia alguns dos medicamentos necessários.

E tudo se deve, lamentavelmente, ao facto de os portugueses ainda não terem percebido os nobres, altruístas e beneméritos intentos do Governo quando sugere (impõe, vá lá) que os cidadãos vivem sem comer e morram sem ficar doentes.

Nesta altura, se calhar os portugueses estão tentados a dizer que estão entregues à bicharada, seja referindo-se a Passos Coelho ou a Cavaco Silva. Mas não é assim. Desde logo porque essa bicharada não gosta de se alimentar de corpos esqueléticos, famintos e em estado terminal.

Desemprego e cortes salariais estão na origem do desmoronar do equilíbrio financeiro das famílias que, como se sabe, continuam a não seguir os conselhos do actual governo que – para mostrar à troika como é credível – não só quer que os portugueses vivam sem comer como, ainda, lhes exige que morram sem ficar doentes.

Mas não há mal que sempre dure. O governo sabe que os decibéis dos actuais gritos vão, lenta mas solidamente, diminuir de intensidade até emudecerem por completo. Com a barriga vazia os portugueses deixam de gritar. É tão simples quanto isso. Vão definhando, morrendo num silêncio indigno de um povo que já deu luz ao mundo. Mas também, é verdade, gerou figurões como Cavaco Silva, Passos Coelho e quejandos.

O sobreendividamento das famílias está a aumentar assustadoramente,  mas é nos grandes centros urbanos que se verificam maiores dificuldades. Lisboa representa mais de um terço.

Isso de ser em Lisboa já não agrada a Pedro Passos Coelho. Estão muito perto. Se ainda fosse lá para cascos de rolha, bem ia a coisa. Mesmo assim nada atemoriza os donos das ocidentais praias lusitanas cada vez mais próximas de Marrocos.

A razão do colapso está quase sempre relacionada com o desemprego, mas também se associa a novas realidades salariais, depois do corte nos salários, da passagem do IVA de 5% para 23% no gás e na electricidade.

Entretanto, para que não restem dúvidas, de que a política de Passos Coelho se resume a não comer e estar calado, o primeiro-ministro já avisou "aqueles que pensam que podem incendiar as ruas" e trazer "o tumulto" que o governo não permitirá esse caminho e saberá decidir quando necessário.

É uma nova versão de fuba podre, peixe podre, panos ruins, cinquenta angolares e porrada se refilares.

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